O E$pírito das Leis https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br Thu, 13 Dec 2018 11:46:25 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 O PT nos empurrou para a ditadura de Bolsonaro https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/10/01/o-pt-nos-empurrou-para-a-ditadura-de-bolsonaro/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/10/01/o-pt-nos-empurrou-para-a-ditadura-de-bolsonaro/#respond Mon, 01 Oct 2018 05:00:36 +0000 https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/haddad-320x213.jpeg https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=540 Não basta a Haddad fazer uma nova “Carta aos Brasileiros” para conquistar o centro

Em editorial de capa no domingo (30), a Folha conclamou Jair Bolsonaro e Fernando Haddad a firmarem compromissos explícitos com a democracia brasileira. Preocupa não apenas a crescente polarização da sociedade, mas sobretudo a postura dos candidatos líderes nas pesquisas de flertar com soluções autoritárias como saídas para a crise.

A se confirmarem as previsões, teremos no segundo turno das eleições presidenciais deste ano o ápice de um processo que levou a confiança da população brasileira nas instituições políticas a seus níveis mais baixos. A exposição das vísceras do nosso sistema político pela Operação Lava Jato, uma recessão econômica quase sem precedentes e a incapacidade do Estado de prover serviços de qualidade (a começar pelos mais básicos, como segurança, saúde e educação) nos colocam em uma encruzilhada histórica.

Baseados no trabalho do germânico-espanhol Juan Linz, os cientistas políticos Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, de Harvard, apresentam no recém-lançado “Como as Democracias Morrem” um roteiro para identificar comportamentos políticos antidemocráticos.

O teste pode ser resumido em quatro perguntas direcionadas a partidos ou políticos: 1) Eles rejeitam as regras do jogo?; 2) negam a legitimidade dos seus adversários?; 3) são tolerantes com a violência?; 4) defendem medidas que restrinjam liberdades civis?

Nas colunas que vem escrevendo para a Folha, Levitsky demonstra como Jair Bolsonaro pontua em praticamente todos os quesitos acima, encarnando um perfil típico de políticos que assumiram o poder de forma legítima, para depois se converterem em déspotas: de Hitler e Mussolini a nossos vizinhos Fujimori e Chávez.

Um ponto que tem passado ao largo de suas análises, contudo, é que, antes de ser um antídoto contra Bolsonaro, o próprio PT se vale do autoritarismo para se viabilizar eleitoralmente.

Analisando atos e palavras dos líderes petistas sob o prisma das quatro perguntas de Levitsky e Ziblatt, torna-se evidente que o PT tem sua cota de responsabilidade por chegarmos a este ponto em que dançamos na beira do precipício.

Para ficar em apenas alguns exemplos, 1) em vez de admitir publicamente sua responsabilidade nos escândalos de corrupção, o partido questionou a legitimidade dos processos de investigação; 2) tachou de “golpistas” aqueles que se posicionaram a favor do afastamento de Dilma Rousseff; 3) silencia diante de atos violentos praticados por grupos políticos que orbitam sob a sua influência, como o MST; e 4) tem sempre na manga uma proposta de regulação da mídia contra a liberdade de imprensa.

Ao longo do último ciclo eleitoral, PT e seus adversários políticos (PSDB e depois o MDB) exploraram estrategicamente a polarização da sociedade por meio do questionamento das urnas eletrônicas, o impeachment, o julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE e todos os desdobramentos da Operação Lava Jato. A ameaça de Bolsonaro só se tornou palpável porque tanto o PT quanto o PSDB viram na polarização um caminho para se elegerem em 2018.

Nesta altura dos acontecimentos, a eleição será decidida por uma parcela considerável da população que enxerga no PT uma ameaça tão perigosa à democracia quanto Bolsonaro. Sendo assim, não basta a Fernando Haddad apresentar uma nova “Carta aos Brasileiros” para conquistar os votos do centro e se eleger. Exigem-se do PT ações concretas — e aqui vão algumas sugestões de quem se considera este eleitor de centro.

Para começar, é fundamental que Haddad se posicione explicitamente sobre algumas questões: sua postura em relação à Lava Jato, se concederá indulto para beneficiar Lula e qual sua visão sobre a ditadura na Venezuela. Além disso, reconhecer os erros da política econômica de Dilma Rousseff e apresentar um novo programa econômico pautado na responsabilidade fiscal e nas reformas são condições fundamentais.

Por fim, seria uma sinalização muito importante se Haddad anunciasse, de antemão, uma equipe de governo que contemplasse membros dos times dos candidatos do centro que ficaram no caminho. Se a proposta é garantir a democracia, construir um ministério com apoiadores de Marina Silva, Henrique Meirelles, Ciro Gomes e — por que não? — Geraldo Alckmin seria um passo importante para afastarmos o fantasma do “nós contra eles”.

Fernando Haddad e o PT precisam entender que essa polarização entre direita e esquerda está impedindo o país de crescer e se tornar menos desigual. É hora de deixar o projeto de poder de lado e governar para todos.

 

Bruno Carazza, doutor em Direito e mestre em Economia, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras) e do blog “O E$pírito das Leis”.

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Novatos e velhacos https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/09/12/novatos-e-velhacos/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/09/12/novatos-e-velhacos/#respond Wed, 12 Sep 2018 05:00:56 +0000 https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/juca-320x213.jpg https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=506 Partidos têm estratégias bastante diferentes quanto à renovação de seus quadros. Isso pode representar muito. Ou nada.

Desde pelo menos as manifestações de junho de 2013, há um clamor difuso na sociedade por renovação na política brasileira. Com a reputação dos políticos tradicionais dizimada por escândalos sucessivos de corrupção, todo tipo de estratégia tem sido tentado para surfar nessa onda e se diferenciar da chamada “velha política”.

Alguns partidos mudaram seu nome e abriram mão até mesmo de serem conhecidos como partidos. Democratas, MDB, Avante, Patriota, Podemos, Democracia Cristã, por exemplo, tentam disfarçar seus verdadeiros nomes de batismo, mas não perderam sua essência de PFL, PMDB, PT do B, PEN, PTN e PSDC.

Houve ainda a criação de novos partidos, embora alguns deles sejam apenas reacomodações de políticos velhos em legendas novas: surgiram o Novo e a Rede, com novas propostas de governança e atuação, mas também o Partido da Mulher Brasileira, o Pros e o Solidariedade.

A tática mais recente de dar nova roupagem à velha disputa político-partidária está no lançamento de muitos novatos na disputa. Como pode ser visto no gráfico abaixo, o percentual de candidatos que nunca disputaram uma eleição antes ultrapassou a barreira dos 40% neste ano, nível mais alto desde 2006 para o cargo de deputado federal.

O gráfico mostra o percentual nas eleições para a Câmara dos Deputados de 2006 a 2018
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

Ao decompormos esse número entre os partidos, entretanto, fica claro que há um comportamento muito divergente entre eles. Como pode ser visto abaixo, o Novo faz jus ao nome e apresenta o maior índice de outsiders nesta eleição: quase 90% de seus membros que pleiteiam uma vaga na Câmara dos Deputados são completamente virgens em termos eleitorais. E para comprovar que o partido não foi criado simplesmente acomodando em seus quadros antigos políticos de outras siglas, ele não lançou um único candidato que já tenha disputado cinco ou mais eleições anteriores.

Analisando o gráfico a seguir, é possível constatar que os partidos menores, ameaçados pela cláusula de desempenho, estão entre os que mais investiram em novos nomes nesta eleição: Novo, PCO, PMB, o PSL de Bolsonaro, a Rede de Marina Silva, entre outros, deram ênfase na captação de neófitos para tentar obter pelo menos 1,5% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados – distribuídos em 9 Estados, com pelo menos 1% em cada um – e assim continuar tendo acesso ao fundo partidário e ao horário eleitoral gratuito em rádio e TV a partir de 2019.

O gráfico mostra o percentual de candidatos estreantes e experientes por partido nas eleições para deputado federal em 2018.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

No extremo oposto, partidos tradicionais, mais bem estruturados, ofereceram pouca abertura para os novatos, concentrando seus esforços em nomes mais experientes. Dessa forma, os tradicionais PSB, PT, PSDB, MDB, PR, DEM e PP estão entre aqueles com menor índice de estreantes nesta eleição. Aliás, PT e PR têm os maiores percentuais de raposas velhas nos seus quadros, sendo que quase ¼ de seus candidatos têm no currículo cinco ou mais eleições.

A despeito dessa grande variedade de perfis entre os partidos no que se refere ao histórico de seus candidatos em eleições passadas, isso tem poucas consequências práticas.

Em primeiro lugar, se as barreiras à entrada são mínimas – os partidos em geral são bastante receptivos e os custos de registro de candidaturas são baixíssimos (basta o preenchimento de alguns formulários) – as chances de sucesso bem reduzidas.

A experiência das últimas eleições indica que apenas 10% das vagas são preenchidas por novatos. E, nesse caso, se o novato não dispuser de um parente político (para garantir acesso ao dinheiro do político e aos cabos eleitorais), ser bastante rico (para bancar sozinho os elevados custos de campanha), ser uma celebridade ou dispor de um rebanho de fiéis (o que dispensa gastos elevados com marketing eleitoral), é praticamente impossível conseguir uma vaga de primeira. Os dados da eleição de 2014 demonstram isso.

O gráfico mostra a origem dos deputados federais eleitos que eram novatos nas eleições de 2014.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

Mas existe uma outra notícia ruim para quem espera que mais candidatos novatos pode levar a uma verdadeira renovação na política brasileira. Num interessante estudo que está prestes a ser publicado num periódico internacional, os pesquisadores Manoel Leonardo Santos (UFMG) e João Victor Guedes-Neto (University of Pittsburgh) investigaram se políticos novatos e tradicionais enxergam o mundo de modo diferente. O artigo se chama “Renovando a política ou mais do mesmo? Comparando novatos e políticos tradicionais nas legislaturas latino-americanas”.

Mediante a pesquisa de um banco riquíssimo de entrevistas realizadas pelo Projeto de Elites Parlamentares da América Latina (PELA) da Universidade de Salamanca, Santos e Guedes-Neto compararam as respostas de 1.155 deputados eleitos recentemente em 17 países da América Latina a respeito de três temas controversos: combate à corrupção, casamento entre pessoas do mesmo sexo e papel do Estado na economia.

Os autores levaram em consideração, em seus testes econométricos, não apenas o fato de o parlamentar ser ou não um outsider na política, mas também se ele pertencia a uma família de políticos ou se era jovem (até 35 anos), além das variáveis de controle “ser de oposição ao governo”  e “se posicionar mais à esquerda ou à direita no espectro ideológico”.

Os resultados encontrados são frustrantes para quem espera, de novatos, uma visão de mundo diferente dos políticos tradicionais. Embora parlamentares estreantes têm em média uma preocupação mais forte com o combate à corrupção, de modo contrário ao senso comum esse efeito é menor entre jovens políticos que não têm vínculos familiares com os antigos donos do poder.

Da mesma forma, o fato de estar ou não exercendo um novo mandato não foi relevante no que diz respeito à tolerância à igualdade entre os sexos. Neste quesito, o efeito parece ser geracional: deputados jovens costumam aceitar melhor o casamento entre homossexuais, independentemente no número de mandatos que acumulam.

Por fim, em termos de regulação econômica, novatos sem laços de parentesco com políticos e jovens tendem a ser mais intervencionistas, embora o resultado também não seja muito robusto.

De maneira geral, e isso vale para as três dimensões estudadas pelos autores, as variáveis ideológicas foram mais relevantes do que o fato de um parlamentar ser ou não novato: independentemente da experiência política prévia, membros da oposição tendem a ser mais combativos à corrupção, enquanto políticos de esquerda costumam ser mais liberais nos valores (casamento homossexual) e pouco propensos a aceitar políticas econômicas pró-mercado.

As conclusões encontradas pelos professores Manoel Santos e João Victor Guedes-Neto, quando somadas às grandes limitações institucionais do nosso sistema eleitoral, jogam um balde de água fria em quem clama por renovação na política brasileira.

O grande número de estreantes nas urnas em outubro próximo é ilusório: poucos deles vingarão, e aqueles que o fizerem tendem a pensar e agir como os velhos políticos tradicionais. Entre novatos e velhacos, teremos mais do mesmo por mais quatro anos.

 

Bruno Carazza, doutor em Direito e mestre em Economia, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras) e do blog “O E$pírito das Leis”.

 

Leia outras análises sobre as eleições 2018:

Não reeleja ninguém?

Black is beautiful?

Sem dinheiro das empresas, pesquisas eleitorais também diminuíram

O novo e o velho nas eleições brasileiras

Partido de rico ou partido de pobre? 

Estratégia dos partidos é não perder a boquinha

 

 

Confira também os textos da série “De Olho nas Propostas”, que comparam os programas de governo dos principais candidatos sobre diferentes temas:

  1. Reforma da Previdência
  2. Combate à Corrupção
  3. Privilégios
  4. Mulheres
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O Novo e o Velho nas Eleições Brasileiras https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/08/29/o-novo-e-o-velho-nas-eleicoes-brasileiras/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/08/29/o-novo-e-o-velho-nas-eleicoes-brasileiras/#respond Wed, 29 Aug 2018 05:00:29 +0000 https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/files/2018/08/protestos_2013-1-320x213.jpeg https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=472 Idade média dos candidatos está subindo a cada eleição. Mas alguns partidos envelhecem mais do que os outros. E não só no pensamento.

Em junho de 2013 eu tinha uma esperança: toda aquela energia cívica dos jovens que tomaram conta das ruas brasileiras despertaria novos talentos, a ponto de mandar para casa os velhos coronéis e fazer emergir novas lideranças políticas, com uma visão mais moderna para o Brasil. Qual o quê.

Ao contrário do que eu desejava, a evolução da idade média dos candidatos a todos os cargos em disputa vem crescendo ano a ano, como pode ser visto no gráfico abaixo. Ok, a população brasileira está envelhecendo a passos largos, e esse movimento é de certa forma natural. Mas a tão propalada renovação da política, se estivesse em curso, poderia se impor frente ao peso dos anos. Não foi o que aconteceu.

O gráfico mostra a evolução da idade média dos candidatos nas eleições brasileiras de 1998 a 2018
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

Existem inúmeros motivos para não observarmos uma estabilização, ou até mesmo uma diminuição, na idade média dos candidatos. Os escândalos de corrupção, combinados com uma severa crise econômica e de segurança pública, solapam a confiança da população na política – e desestimulam os vocacionados a se imiscuir nesse meio que se revela cada vez mais podre.

As regras eleitorais também impõem elevados custos de entrada para os neófitos. Nossas eleições são caras, pois são disputadas no âmbito dos Estados, em geral grandes e populosos. Na falta de partidos com forte identificação popular, as campanhas são personalistas, o que exige gastos elevados em propaganda e no corpo-a-corpo com os eleitores. Além disso, as regras de financiamento eleitoral favorecem quem já é rico ou tem conexões com empresários. Com mínimas chances de se eleger diante de condições tão adversas, muitos nem sequer se arriscam a entrar no jogo.

Por fim, nossos partidos, em geral, são pouco democráticos, dominados por caciques regionais e nacionais que se perpetuam no poder, controlando com mão de ferro a arrecadação e a distribuição de dinheiro. Quando se aposentam ou morrem, deixam herdeiros no comando, perpetuando dinastias.

Mas nem tudo, porém, está perdido. Novos partidos vêm surgindo propondo novas formas de governança, critérios de seleção de quadros e investimento na formação política de seus filiados. Siglas como PSOL, Rede e Novo, tão diferentes ideologicamente, prometem revolucionar o modo de fazer política partidária no Brasil. Se vão ser bem-sucedidos ou se sucumbirão diante do fisiologismo e do patrimonialismo, só o tempo dirá. No entanto, pelo menos sob o ponto de vista da idade média de seus candidatos nestas eleições, esses partidos menores, com plataformas mais bem definidas, têm se diferenciado de seus concorrentes tradicionais.

O gráfico mostra a idade média dos candidatos de cada partido nas eleições de 2018
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

Como pode ser visto acima, Psol, Rede e Novo, ao lado de PCO e PCB, apresentam as candidaturas com menores idades médias no pleito atual. Seus candidatos típicos têm entre 44 e 45 anos, bem menos do que o apresentado pelos rivais do PSDB, PDT, PT e MDB, cuja média de concorrentes está na casa dos 49 a 51 anos.

Olhando numa perspectiva de médio prazo, temos outra evidência de que os grandes partidos brasileiros não estão sabendo envelhecer, quando comparados com os novos entrantes no mercado eleitoral. Concentrando o foco apenas no confronto entre, de um lado, MDB, PT e PSDB, e de outro Psol, Rede e Novo, verificamos que 2018 não é um fato isolado na história recente.

O gráfico mostra a evolução da idade média dos candidatos do MDB, PT, PSDB, Psol, Rede e Novo nas eleições de 1998 a 2018.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

O PT foi o partido que mais envelheceu nas últimas duas décadas. A média de idade de seus candidatos subiu de 41,8 para 50,1 anos. Embora numa intensidade menor, MDB e PSDB seguiram a mesma tendência de aumento da idade média, indicando que os maiores partidos brasileiros estão tendo dificuldades de renovar seus quadros.

Situação inversa vivem Psol, Rede e Novo, que exibem médias de idade bem inferiores e, no caso específico da Rede, inclusive diminuindo a média de seus candidatos – de 47,7 para 44,6 anos de 2014 para cá.

Se no geral a tão sonhada renovação política no Brasil parece estar sendo impedida pelas forças dos velhos coronéis, tem gente inovando e desenvolvendo novas práticas por aí. Resta saber se, e quando, essas startups partidárias começarão a dar lucro.

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Temer e Lula na boleia do caminhão https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/05/25/temer-e-lula-na-boleia-do-caminhao/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/05/25/temer-e-lula-na-boleia-do-caminhao/#respond Fri, 25 May 2018 05:00:50 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=379 Crise dos caminhoneiros é resumo de nossa história de predação política e econômica pelos grupos de interesses


“A população que paga.
Na verdade, tudo que acontece na política
é a população que paga.”

(Cidadão carioca no Jornal Nacional de 24/05/2018 )

Toda crise tem causas imediatas e outras que vêm de longe, corroendo sorrateiramente as estruturas até que, por um curto circuito ou uma sobrecarga qualquer, o prédio desaba.

Especialistas são então chamados a apresentar suas explicações técnicas e representantes do governo anunciam medidas emergenciais e um plano de longo prazo para que a tragédia não ocorra novamente. Imediatamente à tragédia esquerdistas e conservadores enquadram os fatos às suas visões de mundo: foi culpa dos neoliberais golpistas ou do gigantismo do Estado cevado pelos petralhas.

Não é minha pretensão discutir aqui a origem da crise dos caminhoneiros ou seus impactos sociais, políticos e econômicos. Na falta de elementos concretos, vou tentar dar um passo atrás para vê-la em perspectiva. E como os experts convocados de última hora, as autoridades atônitas e os analistas de redes sociais, darei minha contribuição – igualmente reducionista, enviesada e carente de evidências – neste caleidoscópio que é a opinião pública.

Utilizando minhas prerrogativas de profeta do acontecido e isentão assumido, aponto as origens da crise atual em três datas distintas, ao gosto do freguês: 17/05/2017, algum momento entre 06/06/2005 e 05/05/2008 ou 21/04/1500.

A primeira hipótese (a culpa é do Temer): Há pouco mais de um ano Joesley Batista revelou para o Brasil o áudio  em que acertava com Michel Temer, na calada da noite, a compra do silêncio de Eduardo Cunha e Lúcio Funaro na Lava Jato e, de quebra, combinava o pagamento de propinas por futuras benesses para suas empresas no Cade e na CVM. Naquele momento começava a desmoronar todo o trabalho de reformas fiscais desenvolvido por uma das mais bem preparadas equipes econômicas desde o Plano Real.

No desespero por salvar a própria pele, Temer revelou a plenitude de seu espírito peemedebista e vendeu sua alma para o Centrão e a todos os interesses oportunistas que ele representa. Em vez de Reforma da Previdência, Refis generalizados para grandes devedores do Fisco, prorrogação de diversos regimes fiscais especiais e uma reoneração da folha de pagamentos tardia e bem aquém do que seria necessário para corrigir abusos bilionários. No lugar da aprovação das medidas de contenção de despesas com pessoal, total conivência com generosos auxílios-moradia, honorários e bônus de produtividade para a elite corporativista do funcionalismo nos três Poderes.

Para garantir sua sobrevivência contra os avanços da Lava Jato, Temer abriu mão do poder imprescindível de dizer “não”. Em governos fracos, quem tem mais poder de pressão leva: de grandes empresas sonegadoras a magistrados, passando por caminhoneiros – e as megatransportadoras de cargas, claro. Nesse arranjo, os benefícios se concentram em poucos, e os custos são transferidos para a sociedade toda. Vide o acordo entre governo e caminhoneiros de ontem.

Segunda possibilidade (a culpa é do PT): Em algum momento entre a eclosão do Mensalão e a ordem dada a Guido Mantega para abrir os cofres do BNDES e conceder benefícios fiscais bilionários para transformar o tsunami da crise financeira internacional em marolinha, o PT jogou fora os melhores 10 ou 12 anos de nosso período republicano.

É passada a hora de despirmos nossos preconceitos ideológicos e reconhecermos os imensos avanços e a incrível complementariedade do período compreendido entre a adoção do Plano Real e o fim do primeiro mandato de Lula. Sob a batuta dos dois melhores partidos desde o fim da ditadura, domou-se o patrimonialismo atávico para aprovar medidas modernizadoras que atacavam verdadeiramente nossos maiores males: a instabilidade econômica e a desigualdade de renda.

Todo esse esforço progressista, contudo, foi por água abaixo quando, a partir do segundo mandato do PT na Presidência, imaginou-se que a saída para as graves crises de governabilidade (com o Mensalão) e financeira internacional (2008) estava na transformação do governo num balcão de negócios entre políticos e grandes empresas. A combinação da famosa “nova matriz econômica” de Mantega com a governabilidade do MDB de Temer, Cunha, Renan e Jucá gerou a Lava Jato, o impeachment de Dilma, déficits fiscais insustentáveis e 13 milhões de desempregados. Nesse período o empresariado e as corporações do serviço público nadaram de braçada no dinheiro fácil do boom das commodities e na falta de controle do governo e, quando a maré passou, a dívida explodiu. Mas a lição tinha sido muito bem ensinada para os grupos de interesses: pressione que o governo cede.

A hipótese mais plausível (sempre foi assim): Se pararmos pra pensar, desde que Pedro Álvares Cabral aportou nessas terras, funcionamos num moto-contínuo extrativista descrito de forma magistral pelos acadêmicos Daron Acemoglu e James Robinson no imperdível livro Por que as Nações Fracassam. Para os autores, a razão para o atraso de países como o Brasil está na relação simbiótica entre elites econômicas e políticas que se sucedem ao longo do tempo criando políticas públicas e legislações que levam a concentração de renda e poder.

Como ninguém é perfeito, Acemoglu e Robinson chegaram a acreditar que o Brasil tinha aprendido o caminho e iniciado uma virada no início do século XXI. Sabem nada, inocentes. Também iludidos pela bem-sucedida dobradinha FHC-Lula I, esqueceram-se que nossas escolhas sempre foram feitas sob a lógica do rent seeking: a concessão de privilégios do Estado a grupos que exercem pressão sobre políticos e autoridades.

É por causa dele que somos um dos países mais fechados do mundo, que nosso Estado presta péssimos serviços públicos mas tem corporações confortavelmente instaladas no 1% mais rico da população, que nosso Congresso é uma fábrica de benesses de toda natureza e nosso sistema tributário é regressivo e baseado no consumo, e não no patrimônio e na renda. Esqueça o que eu disse sobre os criadores do Plano Real e do Bolsa Família: pensando bem, nunca tivemos um governo com visão clara e ações fortes o bastante para reverter esse sistema de transferência de renda da coletividade para grupos com acesso privilegiado ao poder.

 

Com um sistema político com fortes tendências à fragmentação, os grupos que sabem se organizar melhor e pressionar o governo vão sempre levar vantagem nas negociações e repassar a conta de seus benefícios para a população. Foi assim quando Temer abandonou o compromisso com as reformas fiscais para ficar no poder. E quando o PT propôs ao MDB sociedade na empreitada de permanecer pelo menos 30 anos no poder. Ou quando FHC deixou de usar o capital político adquirido com o fim da inflação para realizar reformas políticas e tributárias corajosas a ponto de romper o ciclo da concentração de renda e poder. Desde tempos imemoriais, os pactos políticos geram imensas oportunidades de negócio para quem se torna íntimo dos poderosos ou consegue emparedar o governante de plantão.

Os caminhoneiros aprenderam isso e jogaram o governo à lona em poucos dias, empurrando para todos nós os custos da redução do preço do diesel e seus tributos. Foram oportunistas, abusaram do poder ao levar o país ao caos? Talvez, mas eles simplesmente agiram como os grandes empresários em busca de Refis, ruralistas renegociando subsídios de suas dívidas com o Banco do Brasil, juízes ameaçando fazer greve a favor do auxílio-moradia…

E não se iludam: daqui pra frente vai ser pior. Depois de Dilma e Temer, em 2019 vem aí mais um presidente fraco, sobrevivente numa eleição de políticos desacreditados, um Congresso cada vez mais Centrão e um colapso fiscal se aproximando em ritmo alucinante.

A disputa pelos nacos de um Orçamento cada vez menor será sangrenta e a conta você sabe que vai pagar.  Se não souber, fica a dica: está lá no início do texto, na epígrafe.

 

Post anterior: As vaquinhas virtuais nas eleições de outubro

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A favor e contra Dilma e Temer https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2017/08/07/a-favor-e-contra-dilma-e-temer/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2017/08/07/a-favor-e-contra-dilma-e-temer/#respond Mon, 07 Aug 2017 08:00:56 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=127 Análise de discursos de deputados nos julgamentos de Dilma e de Temer revela quem são e o que pensam os quatro principais grupos na Câmara a respeito de investigações contra corrupção

Quanto você ganha pra me enganar?
Quanto você paga pra me ver sofrer?
[…]
Ai de mim, de nós dois
Vale quanto pesa reza a lesa de nós dois
“Vale quanto pesa” (Luiz Melodia)
Se a gente falasse menos
Talvez compreendesse mais
[…]
Palavra figura de espanto, quanto
[…]
Mas o tudo que se tem não representa nada
[…]
E tudo que se tem
Não representa tudo
O puro conteúdo é consideração
Não goza de consideração
“Congênito” (Luiz Melodia)

 

Num intervalo de 472 dias a Câmara dos Deputados teve a oportunidade de julgar dois Presidentes da República, fato único em nossa história: em 17/04/2016, decidiu iniciar o processo de impeachment de Dilma Rousseff; e no último dia 02 de agosto, negou autorização para o Supremo Tribunal Federal (STF) processar criminalmente Michel Temer.

Em ambos os processos, pairava a sombra de grandes escândalos de corrupção. O pedido de abertura do processo de impeachment de Dilma trazia consigo acusações a respeito das revelações da Operação Lava Jato (embora ao final ela tenha caído por causa das pedaladas fiscais).

No caso de Temer, as evidências eram mais diretas: todos ouviram a gravação dele se acertando com Joesley Batista e assistiram ao vídeo de seu assessor, Rodrigo Rocha Loures, dando a famosa corridinha com a mala de R$ 500 mil.

Para tentar entender o que levou a Câmara a resultados contraditórios num intervalo temporal tão curto, resolvi compilar os votos e as justificativas de cada um dos parlamentares nas duas votações. E ao contrário do que os resultados diametralmente opostos possam indicar, é possível identificar grande coerência entre os principais grupos formados.

Descartando as ausências, suplências e abstenções, 445 deputados manifestaram-se nas duas votações. De acordo com os votos dados, foi possível dividi-los em quatro grupos.

O dominante, com 211 deputados, alinhou-se totalmente com Michel Temer: votou pelo impeachment de Dilma (“tchau, querida!”) e pelo arquivamento do processo contra o atual presidente.

Em segundo lugar, com 108 parlamentares, figura o grupo favorável às investigações, independentemente do ocupante do Palácio do Planalto. São aqueles que se manifestaram pela abertura do processo contra Dilma e quiseram que Temer fosse investigado pelo STF contra os crimes praticados no caso JBS.

Logo abaixo vêm os deputados alinhados com o PT: denunciaram o suposto golpe contra Dilma no impeachment e gritaram “fora, Temer” na semana passada. Foram 102 deputados no total.

Por fim, temos a turma do “deixa disso”: 22 deputados que votaram contra o impeachment de Dilma e também contra a abertura do processo de Temer. Temos aí um pessoal que não se mostra muito interessado em investigações – e por serem em número reduzido, por economia de espaço não vou analisá-los aqui.

Para verificar como os membros dos três principais grupos justificaram seu posicionamento, solicitei à Câmara dos Deputados as notas taquigráficas das duas sessões de julgamento discutidas aqui.

[Aliás, na minha experiência de mais de três anos trabalhando com a Lei de Acesso à Informação, posso afirmar com segurança de que nenhum órgão tem sido tão prestativo em atender às minhas solicitações do que a Câmara dos Deputados. As respostas sempre são muito rápidas e em formato amigável. Fica aqui meu elogio e uma exortação para que os outros órgãos públicos sigam o seu exemplo.]

De posse das notas taquigráficas, fiz alguns malabarismos no Word e no Excel e computei quais os principais termos utilizados pelos deputados nos discursos dos julgamentos de Dilma e de Temer. E o resultado diz muito a respeito do que move cada bloco de parlamentares e traz indicativos sobre sua postura daqui para a frente.

“Estou com Temer e não abro”

Este grupo de 211 deputados que se posicionou com Temer nas duas votações pode ser visto como a representação da base de apoio do atual presidente. Ele é formado por 44 deputados do PMDB, 27 do PP, 21 do PSDB, 20 do DEM, 19 do PSD, 16 do PR, 14 do PRB, 10 do PTB e 24 de uma miríade de partidos menores.

No gráfico abaixo podemos verificar como eles justificaram seus votos no caso de impeachment de Dilma e na votação da semana passada:

Verificando os principais termos utilizados na sessão do impeachment de Dilma, vê-se que esse grupo se utilizou de um discurso bastante conservador e nacionalista. “Brasil”, “povo”, “Estado”, “família” e “país” foram os 5 termos mais utilizados, sendo que “filhos” e “Deus” também tiveram destaque. Não se nota, entre as expressões mais utilizadas, nenhuma que faça menção a corrupção ou às pedaladas fiscais, diga-se de passagem.

Na votação a respeito da abertura do processo contra Temer, no entanto, despontaram outros termos, como “estabilidade” (foi o segundo termo mais utilizado), “economia”, “econômica” e “reformas”. Tais termos indicam que a decisão de apoiar o presidente não se deveu a uma apreciação a respeito das evidências trazidas ao processo, mas sim de um juízo de conveniência relacionado à estabilidade política necessária para o país superar a crise econômica e aprovar as reformas propostas por Michel Temer.

Da análise de discurso nas duas votações podemos inferir, portanto, que 40% da Câmara dos Deputados é conservador, apoia as reformas econômicas e está fechado com Temer.

“Meu coração é vermelho”

Fazendo oposição direta ao grupo pró-Temer, em torno de 20% da Câmara alinhou-se à esquerda nas duas votações aqui estudadas.

Nesse time estão 56 deputados do PT (nenhum deles descumpriu a orientação do partido), 10 do PDT, 9 do PC do B, 6 do PSOL e 5 do PSB e o restante disperso entre outros partidos menores (16 deputados no total).

Esses parlamentares bradaram contra o “golpe” (expressão mais utilizada) contra Dilma e defendeu valores como “democracia” e “Constituição”, além dos tradicionais “Brasil”, “povo” e “país”. Note-se que a ira dos defensores de Dilma na primeira votação estava muito mais centrada em Eduardo Cunha do que em Michel Temer, de acordo com o número de referências a cada um deles.

Já na segunda votação o “fora, Temer” ganhou força (“fora”, “Michel” e “Temer” estão entre os 5 termos mais utilizados). Naturalmente, os termos “investigação” e “corrupção” surgiram apenas nesta seção. Mas o que mais me chamou a atenção foi a alta incidência das palavras “reforma”, “Previdência”, “direitos” e “trabalhista” – indicando que este grupo se coloca totalmente contra qualquer iniciativa do atual governo de se promover reformas econômicas no país.

“Se há governo, sou contra”(será?)

Eu tenho simpatia pela atitude dos 108 deputados que se manifestaram tanto pela abertura do impeachment contra Dilma como a favor do prosseguimento do processo criminal contra Temer no STF. Afinal, mesmo que tenham sido movidos por interesses estritamente pessoais, eles apoiaram as investigações diante de indícios de cometimento de crime (de responsabilidade ou comuns) dos Presidentes no poder.

Esse grupo é bastante heterogêneo. Congrega representantes de todos os partidos com representação no Congresso, exceto os alinhados à esquerda (PT, PC do B e PSOL), o PEN (novo Partido de Bolsonaro) e o PSL.

Ele é dominado pela dissidência do PSDB que se colocou contra Temer na semana passada (19 deputados) e pelo PSB (16), seguido por um número baixo de membros dos demais partidos.

Devido à polaridade entre o grupo de Temer (com 40% da Câmara) e dos aliados do PT (que têm 20%) é neste grupo que reside o futuro do atual governo. Se o presidente conseguir cooptar boa parte de seus membros, é possível que consiga salvar a sua pele até o final de 2018 e, quem sabe, aprovar mais alguma reforma. Por isso é importante saber o que pensam esses parlamentares.

O gráfico acima revela que no julgamento de Dilma pesou mais aquela visão conservadora que também predominou entre o grupo pró-Temer: “Brasil”, “povo”, “país”, “Estado” e, mais abaixo, “família” e “Deus” foram termos utilizados com muita frequência.

Eu concluo daí que nesse grupo que tem o poder de definir o futuro de Temer bate um coração conservador, o que pode ajudar na governabilidade daqui pra frente e na aprovação de reformas econômicas.

Na votação da última semana, no entanto, esse grupo deu mais ênfase ao tema do combate ao desvio de recursos públicos: passaram a predominar referências a “investigação(ões)”, “corrupção”, “prosseguimento”, “denúncias”, “verdade”…

Isso quer dizer que, talvez de olho em 2018, boa parte desses 108 deputados (fundamentais para aprovar uma PEC, por exemplo) pode abandonar de vez o barco de Temer se surgirem novas acusações e evidências contra o presidente, comprometendo seriamente a continuidade de seu governo.

Mas, como diria o grande Melodia, “o tudo que se tem não representa nada, o puro conteúdo é consideração”.

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Porque vocês não sabem do lixo ocidental https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2017/06/13/porque-voces-nao-sabem-do-lixo-ocidental/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2017/06/13/porque-voces-nao-sabem-do-lixo-ocidental/#respond Tue, 13 Jun 2017 05:00:12 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=26 Para ser competitivo, partidos têm que captar doações e ceder a demandas privadas

“Por que vocês não sabem do lixo Ocidental?
(…)
Eu sou da América do Sul
Sei vocês não vão saber”

(Para Lennon e Mccartney – Fernando Brant, Márcio Borges e Lô Borges)

No último dia 20/05 escrevi um artigo para a Folha criticando as condições dos acordos de leniência e de delação premiada firmados com a JBS e seus principais executivos e acionistas. Para ilustrar meu argumento, citei o livro “Por que as Nações Fracassam?”, escrito pelo economista Daron Acemoglu (MIT) e pelo cientista político James Robinson (Universidade de Chicago).

Analisando o desenvolvimento de sociedades da Pré História até os dias atuais, os autores chegam a um diagnóstico que considero perfeito para descrever o Brasil: um país dominado há séculos por uma elite econômica e uma casta política umbilicalmente relacionadas, produzindo políticas públicas e leis concentradoras de renda e de poder.

Na conclusão do livro (atenção para o spoiller!), Acemoglu & Robinson apostavam que estávamos a ponto de atingir o momento crítico de criação de instituições políticas e econômicas pluralistas, que fomentam a alternância do poder, a competição e a inovação. Na visão dos autores, poucos países subdesenvolvidos pareciam tão aptos a romper o ciclo de extrativismo político e econômico e iniciar uma nova era de crescimento acompanhado de distribuição de renda como o Brasil.

Para Acemoglu & Robinson, a ascensão do PT ao poder representava a possibilidade dessa grande virada no desenvolvimento brasileiro. Um partido com forte base social, que cresceu ao longo de três décadas acumulando administrações municipais e estaduais que fomentavam a participação social (vide as experiências dos conselhos sociais e dos orçamentos participativos) e que chegou à Presidência da República comprometido com “a provisão de serviços públicos, expansão educacional e um nivelamento das condições do jogo” na economia. Na conclusão do livro, o Brasil é retratado pelos autores de modo muito mais auspicioso do que a Venezuela – e “seus políticos corruptos, com redes de compadrio” com o empresariado – ou o Peru, em que fitas de vídeos revelavam políticos sendo comprados por Fujimori e Montesinos. O Brasil havia “quebrado o molde” de típica República de Banana latino-americana.

Obviamente o otimismo de Acemoglu & Robinson não se devia apenas a uma predileção especial pelo PT. Na sua análise estão implícitas as mudanças no ambiente institucional que permitiram que um partido de esquerda vencesse as eleições presidenciais e implementasse o seu programa de governo sem rupturas. E isso aconteceu devido a um histórico que começa na redemocratização, se aprofunda com a Constituição de 1988, consolida-se com o Plano Real e, na visão dos autores, culmina com a eleição de Lula em 2002 e os sucessivos mandatos petistas. Uma história de sucesso, portanto, que sinalizava ao mundo que estávamos trilhando um caminho de reformas econômicas e sociais incrementais, voltadas para o crescimento e a redução da desigualdade social.

O livro de Acemoglu & Robinson foi lançado em 2012. Àquela época o Brasil já tinha decolado na capa da Economist, mas logo depois a mesma revista retrataria o mesmo Cristo Redentor desgovernado, perguntando se (melhor seria por que) havíamos “estragado tudo”. Sobretudo, naquela época ainda não havia a Operação Lava Jato.

As revelações obtidas pelas investigações da Polícia Federal e do Ministério Público, inclusive as derivadas das delações premiadas, expuseram as vísceras de nossa República, em que a “coisa pública” era devorada por um esquema tão extrativista que certamente surpreenderia Acemoglu & Robinson.

A Operação Lava Jato revelou que, ao contrário do que imaginaram os dois pesquisadores, a associação entre as elites política e econômica no Brasil não respeita coloração partidária. O envolvimento da cúpula do PT com as grandes empreiteiras e a JBS revela o mesmo modo de operação praticado desde sempre no Brasil: em troca de propinas e contribuições de campanhas, os políticos oferecem licitações de cartas marcadas, benefícios fiscais, crédito subsidiado em bancos públicos, regulação favorável e outras benesses para as grandes empresas. Aliás, é difícil imaginar um exemplo tão evidente dessa “parceria público-privada” no Brasil do que aquela conversa de Temer com Joesley Batista no porão da residência oficial, altas horas da noite…

Analisando os dados oficiais de financiamento eleitoral, percebe-se como o PT passa a atrair cada vez mais recursos à medida em que se consolida como uma alternativa viável de poder, a ponto de aproximar-se dos níveis de PSDB e PMDB, partidos que tradicionalmente ocupam as posições de liderança na atração de capital nas eleições brasileiras.

Volume de financiamento privado – pessoas físicas, pessoas jurídicas e autofinanciamento de candidatos – de partidos selecionados nas eleições de 1994 a 2014

Sob o prisma das fontes de financiamento das campanhas, também é possível ver que a partir de 2002, quando assumiu a Presidência, o PT torna-se mais dependente de recursos empresariais, aproximando-se de forma crescente do perfil apresentado pelos seus principais rivais com inclinação ideológica à sua direita.

Percentual de doações feitas por pessoas jurídicas no financiamento privado de partidos selecionados nas eleições de 1998 a 2014

Essa aproximação junto aos grandes empresários para tornar viáveis as suas campanhas eleitorais resultou, como consequência, numa menor representatividade das doações de pessoas físicas. Nesse ponto, os dados apontam claramente para uma distinção entre a evolução do perfil do PT – e também de seu principal e mais fiel parceiro de coligações nas eleições presidenciais, o PC do B – e dos partidos de esquerda mais radicais, como o PSOL, o PSTU, o PCB e o PCO. No gráfico abaixo nota-se que, a partir de 2002, PT e PC do B conseguiram atrair um volume tão significativo de recursos empresariais que a participação das doações provenientes de pessoas físicas foi sendo reduzida a cada ciclo eleitoral para um nível bem inferior ao dos demais partidos de esquerda que não participaram oficialmente da coligação no poder.

Percentual de doações feitas por pessoas físicas no financiamento privado de partidos de esquerda nas eleições de 1998 a 2014

O que eu quero demonstrar com os dados acima é que, para tornar-se competitivo no plano eleitoral, o PT adotou as mesmas estratégias de seus principais adversários políticos, captando doações milionárias de grandes empresas e – como ficamos sabendo a cada dia com os desdobramentos da Operação Lava Jato – cedendo a suas demandas por mais benesses.

Acemoglu & Robinson, à época em que publicaram o seu livro, não perceberam que, a despeito de suas louváveis políticas voltadas ao combate à pobreza e à diminuição da desigualdade social, o PT não foi capaz de romper com as amarras institucionais que unem nossas elites política e econômica.

Assim, se estamos interessados em realizar uma verdadeira “virada crítica” em nossa história de corrupção e desvio de recursos públicos, temos que investigar as engrenagens que fazem esse sistema funcionar no modo “concentração de renda e poder” e buscar soluções para desarmá-lo. Essa é a mais urgente reforma institucional a ser implementada no Brasil – e vai muito além da tão falada reforma política, porque envolve os mecanismos que tornam os assuntos de Estado tão atraentes para os grupos de interesses.

Nas próximas postagens pretendo discutir alguns desses problemas e as possíveis soluções disponíveis – seja na agenda legislativa, na academia ou na experiência internacional. Aguardo vocês!

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Charles-Louis de Secondat, barão de La Brède e de Montesquieu (1689-1755), conhecido simplesmente como Montesquieu, levou 20 anos escrevendo “O Espírito das Leis”.

Este blog não tem a pretensão de alcançar a influência desse grande tratado de teoria política. Ele apenas pega emprestado o nome escolhido por Montesquieu porque tem a legislação como o seu objeto de estudo.

Meu objetivo aqui é discutir o modo como as leis são concebidas no Brasil. A proposta é analisar projetos legislativos e políticas públicas que estão em pauta sob uma perspectiva mais técnica, utilizando elementos da Economia, do Direito e da Ciência Política.

Parto do princípio de que a discussão política deve ser mais qualificada, utilizando mais dados e menos opinião. Acredito que entre o “sou a favor” e o “sou contra” de uma reforma da previdência ou de uma reforma trabalhista, por exemplo, existe uma miríade de possibilidades de tornar a legislação mais próxima do “interesse público” – seja lá o que isso significa.

As leis não caem do céu, e no processo de sua elaboração afloram interesses, lobbies e negociações muitas vezes “pouco republicanas” (por isso o cifrão no título). Minha intenção ao escrever os textos deste blog da Folha, portanto, é lançar luz sobre a tramitação de projetos relevantes na pauta do Congresso, tentando contribuir para o debate político que, hoje em dia, situa-se cada vez nesta ampla arena virtual.

E como a ideia aqui não é veicular esta ou aquela visão ideológica ou partidária do mundo, fique à vontade para discordar e opinar, por meio do e-mail brunocarazza.oespiritodasleis@gmail.com. Conto com suas contribuições!

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