O E$pírito das Leis https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br Thu, 13 Dec 2018 11:46:25 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 O presente de grego do Congresso para Bolsonaro https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/11/09/o-presente-de-grego-do-congresso-para-bolsonaro/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/11/09/o-presente-de-grego-do-congresso-para-bolsonaro/#respond Fri, 09 Nov 2018 04:00:24 +0000 https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/files/2018/11/sessao_senado-320x213.jpg https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=564 Votação do reajuste do Judiciário é um retrato de como são produzidas nossas leis, e do que nos espera em 2019

A aprovação, pelo Senado Federal, dos projetos de lei que reajustam a remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal e do Procurador-Geral da República para R$ 39.293,32 é muito mais grave do que se imagina.

As redes sociais repercutiram a indignação coletiva. Como um Congresso que acaba de levar uma sova nas urnas, num claro recado de que a população não aguenta mais privilégios, aprova um reajuste de 16,8% para o Judiciário, no meio de uma crise fiscal gravíssima que será o grande desafio para o próximo governo?

Não se iluda, caro leitor que espalhou para todos os seus contatos a lista dos traidores da Pátria que votaram a favor do reajuste. Tudo que é ruim, pode piorar. A verdade dói – e é no seu bolso que você vai sentir.

Para o presidente eleito, e seu ministro da Economia, o recado também parece claro: é assim que a banda sempre tocou e o jogo é bem mais complicado do que parece.

Vamos aos fatos.

  1. Não acredite nas justificativas

Regra de ouro para quem se interessa por acompanhar o Congresso Nacional: sempre desconfie das justificativas apresentadas por autores e relatores de projetos de lei. Em geral, o indefensável vem embalado com palavras bonitas, argumentos falseados e muito senso comum.

No parecer do senador José Maranhão (MDB/PB), relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça, consta que o reajuste deveria ser aprovado porque, “como é sabido, a remuneração dos membros da nossa Suprema Corte se encontra defasada”.

O relator parte de uma verdade (desde 01/01/2015, data do último reajuste, a inflação já acumula 25,7%), mas esconde o todo: o projeto não se restringe aos ministros do STF, pois nossa Constituição determina que ele seja o teto da remuneração de todo o funcionalismo público brasileiro. Em outras palavras, aumentar o subsídio dos ministros do STF tem efeitos em cascata sobre toda a estrutura de cargos e salários na União, Estados e municípios. E sobre isso o ilustre relator simplesmente silenciou.

  1. Desconfie dos números

Assim como não podemos nos fiar nas palavras, em geral os números apresentados (quando são apresentados) costumam sub ou superestimar a realidade, de acordo com o interesse defendido.

Instado a se manifestar sobre o impacto orçamentário do reajuste, o Conselho Nacional de Justiça misturou as contas do projeto de reajuste do subsídio dos ministros do STF com outro, relativo aos seus servidores, de modo a não deixar claro o impacto isolado de cada um deles. Mais uma lição: transparência, principalmente quanto a seus rendimentos, não é o forte de nosso Judiciário.

No voto em separado apresentado pelo senador Valdir Raupp (MDB/RO) há uma estimativa de que o impacto da elevação do teto do STF seria de R$ 813,14 milhões por ano no Judiciário.

Insatisfeito com as estimativas apresentadas pelos principais interessados no reajuste, o senador Ricardo Ferraço (PSDB/ES) acionou a Consultoria de Orçamento do Senado para elaborar um cálculo envolvendo os reais efeitos do reajuste para os cofres públicos.

Os técnicos do Senado levaram em conta o efeito cascata do reajuste sobre todo o Judiciário, o Ministério Público e os Tribunais de Contas, inclusive os estaduais, e também seu impacto sobre os servidores dos outros Poderes que têm seus rendimentos limitados pelo teto do STF.

Levando em conta todas as suas repercussões, o reajuste custará à União e aos Estados a exorbitância de R$ 5,3 bilhões anuais.

  1. A Lei de Responsabilidade Fiscal é para inglês ver

Quando foi aprovada, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi festejada como um grande marco em nossa lenta caminhada rumo à seriedade no trato do dinheiro público. Na prática, ela tem sido solenemente descumprida quando se trata de impor travas ao descontrole de gastos.

Relator do projeto na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), o senador Ricardo Ferraço chamou a atenção para o fato de que, uma vez aplicado, o reajuste levará ao descumprimento dos limites de alerta, prudenciais ou máximos permitidos pela LRF nos Tribunais de Justiça de 13 Estados (RR, MG, SP, MT, CE, RJ, BA, SE, SC, ES, RO, TO e PB) e nos Ministérios Públicos Estaduais de outros 21 Estados – nos cálculos da Consultoria de Orçamento, apenas os MPs gaúcho, pernambucano, baiano, amazonense e paulista sobreviveriam.

Afora o estrondoso impacto nos combalidos orçamentos da União e do Estado, o descumprimento dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal deveria ser suficiente para levar ao arquivamento do projeto de reajustar o teto do funcionalismo.

Como a verdade é muitas vezes inconveniente, o parecer de Ferraço nunca foi votado – numa manobra regimental, foi substituído em plenário por outro texto, de autoria do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB/PE), bem mais ameno.

Por incrível que pareça, o parlamento brasileiro é o primeiro a descumprir as leis que ele próprio cria.

  1. Esse rombo não será coberto pelo fim do auxílio-moradia

Você já deve ter ouvido ministros do STF, membros do Ministério Público e parlamentares dizerem que o reajuste não impactará o orçamento, pois será compensado pelo fim do auxílio-moradia.

Em primeiro lugar, não temos garantia nenhuma de que o auxílio-moradia será mesmo extinto. Afinal de contas, a ação que questiona sua constitucionalidade vem sendo cuidada com carinho pelo ministro Luiz Fux há anos no STF. Mas mesmo que, num arroubo de civismo, o STF decida proibir o pagamento desse penduricalho, ele será insuficiente para cobrir o rombo de R$ 5,3 bilhões no orçamento.

A conta pode ser feita num guardanapo de papel. De acordo com os últimos dados divulgados, o Brasil tem 18.168 magistrados e 13.087 membros do Ministério Público na ativa. Basta multiplicar a soma das duas categorias pelo valor do auxílio (R$ 4.377,73) para verificar que a economia com a sua extinção seria de R$ 1,6 bilhão em 12 meses – menos de um terço, portanto, da despesa extra a ser criada com o reajuste.

  1. Que Bolsonaro e Paulo Guedes aprendam a lição

A aprovação do reajuste do teto do funcionalismo dá uma pequena mostra do que o novo governo vai enfrentar no Congresso a partir de janeiro. Embora conte com uma boa base de apoio formada por parlamentares de partidos aliados, agregados do Centrão e membros das bancadas ruralista, evangélica e da segurança pública, não será fácil para o presidente eleito (como não foi para nenhum dos seus antecessores) enfrentar os fortes interesses corporativos no Congresso.

Uma coisa será aprovar uma pauta de projetos relacionados à agenda conservadora de Bolsonaro (escola sem partido, diminuição da maioridade penal, estatuto do desarmamento); outra bem mais difícil será cortar privilégios e aprovar medidas de contenção fiscal.

A votação do reajuste do teto do STF demonstra exatamente isso: a proposta recebeu votos contrários de apenas 5 senadores que continuarão exercendo seus mandatos em 2018, contra 18 votos favoráveis (entre os que não foram reeleitos, houve 11 votos contrários e 23 apoios).

O gráfico mostra o número de votos favoráveis e contrários ao projeto de reajuste do subsídio dos ministros do STF entre os senadores que terão e não terão mandato a partir de 2019.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Senado.
  1. Não conte com a oposição (aliás, onde estavam PT e PSDB para impedir responsavelmente a aprovação do projeto?)

Analisando os dados da votação por partido, podemos observar melhor como se comportou o Senado.

O gráfico mostra os votos favoráveis e contrários por partido.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Senado.

Como pode ser visto no gráfico acima, o bloco dos partidos do centro e da direita, onde deve se localizar a base de sustentação de Bolsonaro, votou em peso a favor do reajuste do Judiciário (com exceção do DEM). Isso é um péssimo sinal a respeito de seu comprometimento com a pesada agenda de ajuste proposta por Paulo Guedes.

Do lado de uma virtual “oposição responsável” no governo Bolsonaro, a postura do PSDB foi lamentável. O partido ofereceu a maior quantidade de votos favoráveis ao reajuste (10 a favor, apenas um contra), o que demonstra que a responsabilidade fiscal há muito deixou de ser um valor para o partido que criou a LRF.

O outro ponto negativo é o PT. Além de ter rachado entre senadores a favor e contra o reajuste (situação rara para um dos partidos com maior disciplina partidária no país), o partido apresentou um alto índice de parlamentares ausentes à votação – o que pode ser mais uma evidência de que o partido está muito mais interessado com o que acontece em Curitiba do que com os destinos do país sendo decididos em Brasília.

O gráfico mostra o número de ausentes na votação por partido.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Senado.
  1. Veta Temer?

Por fim, é preciso lembrar que Temer iniciou seu “mandato-tampão” referendando aumentos salariais concedidos de modo irresponsável por Dilma a carreiras da elite do funcionalismo.

Mais tarde, em troca de salvar seu mandato depois do Joesley Day, o presidente, já manco, cedeu ao fisiologismo e aceitou toda sorte de pressões corporativas, das novas edições do Refis ao recentíssimo Rota 2030 para a indústria automobilística.

Diante desse histórico de leniência com a ação dos grupos de interesse, caberia agora a Temer um último gesto de responsabilidade fiscal, aliviando um pouco a carga que recairá sobre o governo Bolsonaro?

Uma dica: seu partido, o MDB, esteve por trás de todas manobras e ofereceu a maior parte dos votos e ausências que contribuíram para a aprovação do reajuste do Judiciário e de todo o teto do funcionalismo.

 

Bruno Carazza, doutor em Direito e mestre em Economia, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras) e do blog “O E$pírito das Leis”.

 

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Renovação versus Conservadorismo https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/10/22/renovacao-versus-conservadorismo/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/10/22/renovacao-versus-conservadorismo/#respond Mon, 22 Oct 2018 04:00:11 +0000 https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/2-Gleisi-e-Aécio-Pedro-Laeira-Folhapress-2-320x213.jpg https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=558 Percentual de novatos no Congresso é de 22,8%, menor que os 50% propalados.

Na Ilustríssima do último dia 14 eu procurei demonstrar que a tão falada renovação do Congresso Nacional teria sido muito maior se as regras eleitorais, em especial a distribuição do fundo eleitoral, não tivessem sido desenhadas para manter o status quo de nossa elite política. Na última semana a cientista política Simone Diniz, professora da Universidade Federal de São Carlos, me chamou a atenção para um outro aspecto dessa dinâmica.

Em evento realizado pela RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade) e pela Fundação Fernando Henrique Cardoso, ela argumentou que, pesquisando a história pregressa dos novos parlamentares eleitos, a tal “renovação recorde” perde muito da sua força. A explicação está no fato de que muitos desses “novatos” já haviam exercido mandatos eletivos anteriormente. Não são, portanto, neófitos na política nacional.

Seguindo a trilha indicada por Simone, constatei que, dos 513 futuros deputados federais, 251 exerceram mandato na atual legislatura. Além deles, foram alçados à Câmara dos Deputados 68 deputados estaduais ou distritais, 28 vereadores, 3 vice-governadores, 4 vice-prefeitos e até 3 senadores (Aécio Neves, Gleisi Hoffmann e Lídice da Mata) –todos exercendo seus mandatos. Haverá ainda 39 deputados que, embora não estejam exercendo mandato atualmente, foram eleitos para algum cargo público nos últimos 30 anos.

Isso quer dizer que, ao todo, apenas 117 futuros deputados federais podem ser considerados novatos. A taxa real de renovação, portanto, é de 22,8% –um número bem menor do que a propalada renovação de quase 50% do parlamento.

Se um maior número de deputados com experiência prévia no Executivo ou no Legislativo levará a um melhor exercício do mandato ou à repetição das velhas práticas da nossa política, só o tempo dirá. Mas podemos especular a partir da análise do perfil desses dois grupos.

Entre os 117 parlamentares novatos, 38 vêm do partido de Bolsonaro (PSL), 7 do PRB e 7 do Novo –os 3 partidos líderes dessa renovação. A onda de votação do capitão reformado levou à Câmara 20 militares ou ex-militares que nunca ocuparam um cargo eletivo antes.

E numa eleição onde dizem que o dinheiro deixou de importar, 45 dos novos parlamentares declararam ao TSE possuir patrimônio superior a R$ 1 milhão. São indícios, portanto, de que teremos um parlamento mais conservador vindo aí.

Por outro lado, levando em consideração os deputados que conseguiram se reeleger, sua atuação parlamentar nos oferece outras pistas sobre os desafios para o próximo governo, seja ele qual for.

Comecemos pela urgentíssima reforma da Previdência. Entre os deputados reeleitos, 108 deles são membros da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social. Somando a eles mais 17 signatários da Frente em Defesa do Serviço Público, o novo presidente contará, de saída, com um quarto da nova Câmara já posicionada em defesa dos interesses corporativistas do serviço público e contra uma mudança abrangente nas regras previdenciárias.

Em relação a valores morais e à postura em relação ao combate à criminalidade, as frentes parlamentares de Segurança Pública, em Defesa da Vida e da Família, Evangélica e Católica contam com 164 parlamentares reeleitos, o que contrasta fortemente com os 86 da bancada em defesa dos direitos humanos. Caso Bolsonaro seja eleito, suas propostas nessa área parecem contar com uma ampla avenida rumo à aprovação.

Em relação ao meio ambiente, a bancada ruralista reelegeu 80 deputados, enquanto a ambientalista fez apenas 49 membros. Levando em conta que o candidato líder das pesquisas pretende fundir os dois assuntos num mesmo ministério, a ser destinado a um líder do agronegócio, esses números indicam o rumo que as políticas públicas podem tomar nesse campo.

Analisando com maior profundidade os dados, portanto, podemos verificar que a principal marca do novo Congresso não é a renovação, mas sim o conservadorismo. É com essa realidade que teremos que lidar nos próximos quatro anos.

Bruno Carazza, doutor em Direito e mestre em Economia, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras) e do blog “O E$pírito das Leis”.

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O sistema não funciona https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/09/24/o-sistema-nao-funciona/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/09/24/o-sistema-nao-funciona/#respond Mon, 24 Sep 2018 05:00:34 +0000 https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/Valdemar-320x213.jpg https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=532 Regras do presidencialismo de coalizão geram pouca representatividade e alto custo

Na Ilustríssima do último dia 9, o cientista político Carlos Pereira (FGV/RJ) defendeu o papel exercido por partidos não ideológicos no sistema político brasileiro. Para ele, não faz sentido condenar a existência de siglas não programáticas porque são elas que exercem o papel de âncoras no nosso presidencialismo de coalizão.

Em seu raciocínio, Pereira separa os partidos em três grupos. Buscando liderar o jogo político nacional, legendas ideologicamente mais definidas, como PT e PSDB (mas também Rede e PDT), têm como sua estratégia principal vencer a disputa à Presidência da República para, assim, implementar sua agenda para o país.

Ao redor desses partidos majoritários gravitam outros mais amorfos. Sua missão não é conquistar o Poder Executivo, mas garantir uma votação que lhes confira um papel central no Legislativo. É o caminho trilhado historicamente pelo (P)MDB, mas que vem sendo seguido pelos demais partidos do Centrão, que acabam dando sustentação ao governo eleito, seja ele qual for.

Por fim, existem os partidos rentistas, menores e essencialmente fisiológicos, que sobrevivem graças aos recursos do fundo partidário e do horário eleitoral gratuito.

De acordo com a tese de Carlos Pereira, nosso sistema político não precisaria de mudanças substanciais por dois motivos. De um lado, a aprovação da cláusula de desempenho e do fim das coligações legislativas a partir de 2020 seriam suficientes para combater os partidos rentistas. De outro, as propostas de reforma política destinadas a aproximar eleitores e legisladores (como a adoção do sistema distrital misto ou puro) não seriam garantias de maior representatividade.

O raciocínio apresentado por Pereira representa a visão dominante da ciência política brasileira: a de que nosso presidencialismo de coalizão funciona. Na nossa opinião, trata-se de uma visão extremamente otimista e que impede que avancemos na discussão de melhorias no funcionamento de nossa política.

Para começo de conversa, as regras do nosso sistema proporcional não geram um Congresso que represente a imensa diversidade da população brasileira. Justamente porque a maioria dos partidos não é ideológica, as eleições tornam-se personalistas. Para piorar, são disputadas em territórios muito grandes (os estados) e em lista aberta (onde todos concorrem com todos).

O resultado disso é o encarecimento das campanhas, fazendo com que apenas candidatos ricos, bem conectados com o empresariado ou com grande visibilidade consigam ser eleitos. Não é por outro motivo que nosso Congresso é majoritariamente masculino, branco, rico e crescentemente evangélico.

Além disso, o raciocínio desenvolvido por Pereira não leva em consideração que é precisamente na interação entre os Presidentes da República e os líderes dos partidos não ideológicos (MDB ou Centrão) que são geradas legislações e políticas públicas com custos fiscais e sociais altíssimos – sem falar em oportunidades de corrupção.

O pragmatismo político e o vazio ideológico do MDB e da sopa de letrinhas dos partidos do Centrão criaram o caldo de cultura que permitiu ao grande empresariado brasileiro e às corporações do funcionalismo público abusarem de medidas que nos afundaram na atual crise fiscal e reverteram a tendência de queda da desigualdade social.

Desonerações fiscais, sucessivos Refis, créditos subsidiados e reajustes salariais fora da realidade foram o preço pago pela sociedade brasileira para garantir a governabilidade em nosso presidencialismo de coalizão.

Para piorar, os incentivos postos na atual eleição não nos deixam ter esperanças. A distribuição dos recursos do fundo eleitoral e uma campanha curta e polarizada provavelmente conduzirão à eleição de um presidente fraco e um Congresso ainda mais fragmentado e pouco ideológico.

Não importa se o próximo presidente será Bolsonaro, Haddad ou um terceiro – para governar, ele terá que comer na mão do MDB e do Centrão, que cobrarão um preço alto pelo seu apoio. E ele será pago por todos nós.

Enquanto isso, a nata de nossa ciência política continua a considerar que está tudo bem e que o sistema funciona.

Bruno Carazza, doutor em Direito e mestre em Economia, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras) e do blog “O E$pírito das Leis”.

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O agro é tech, mas também é tóxico https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/06/27/o-agro-e-tech-mas-tambem-e-toxico/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/06/27/o-agro-e-tech-mas-tambem-e-toxico/#respond Wed, 27 Jun 2018 05:00:16 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=420 Tramitação do projeto de lei que pretende flexibilizar a comercialização de agrotóxicos mostra como grupos de interesses controlam a produção de leis no Brasil

 

Há quase um consenso de que o agronegócio é um dos setores mais dinâmicos da economia brasileira. Trata-se de um caso raro em que conseguimos aprimorar nossas vantagens comparativas (território vasto, clima e solo) com inovações tecnológicas desenvolvidas no seio de centros de pesquisas de ponta, como a Embrapa, a Esalq e as Universidades Federais de Lavras e Viçosa. A representação do setor no Congresso Nacional, contudo, é a antítese desse cenário de prosperidade. Como erva daninha, a bancada ruralista se alastra sobre todos os campos de seu interesse, sufocando qualquer possibilidade de debate democrático.

Estou me referindo, obviamente, à aprovação de projeto de lei que flexibiliza a comercialização de agrotóxicos no país pela Comissão Especial encarregada de analisar o assunto na Câmara dos Deputados. No entanto, nas duas últimas décadas a bancada ruralista se tornou uma força parlamentar superior à maioria dos partidos, sendo por isso cortejada por todos os presidentes, de FHC a Temer, passando por Lula e Dilma. Em troca de apoio ao governo, os ruralistas foram capazes de aprovar uma gama imensa de benefícios setoriais, incluindo renegociações de seus empréstimos junto ao Banco do Brasil, parcelamento de suas dívidas tributárias, bem como medidas regulatórias favoráveis à comercialização de transgênicos e, agora, pesticidas.

Embora seja plenamente aceitável que um determinado setor ou grupo de interesses mobilize esforços junto ao Congresso ou ao governo para obter legislação ou políticas públicas favoráveis – isso faz parte do jogo democrático –, é preciso dizer que esse jogo, no Brasil, não tem nenhum fair play. E a tramitação do Projeto de Lei nº 6.299/2002, que regula os agrotóxicos no país, é um triste exemplo de como o processo legislativo é dominado por quem tem acesso aos donos do poder.

No meu livro “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” eu demonstro como parlamentares vinculados à Frente Parlamentar da Agropecuária dominam instâncias importantes na tramitação de projetos, como as Comissões de Agricultura e de Meio Ambiente, além de terem sido determinantes na votação de projetos sensíveis ao setor, como o novo Código Florestal. No caso do projeto de lei dos agrotóxicos não foi diferente.

Para não deixar dúvidas de suas intenções, o projeto foi proposto pelo senador Blairo Maggi, atual Ministro da Agricultura, cuja família é considerada a maior produtora de soja do mundo. Na sua versão original, a proposta tinha um único dispositivo, liberando do registro prévio nos órgãos federais (Ministérios da Agricultura, Saúde e Meio Ambiente) os agrotóxicos cujos princípios ativos fossem “substancialmente equivalentes” a outros previamente registrados. A razão para a proposta era simplificar o processo e, assim, estimular a concorrência e baixar os preços dos pesticidas.

Uma vez aprovado no Senado em 2002, quando chegou na Câmara dos Deputados o projeto foi designado para tramitar em quatro comissões permanentes: i) a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, ii) a Comissão de Seguridade Social e Família, iii) a Comissão de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural e, finalmente, iv) a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Em cada uma delas, a proposta deveria ser analisada por um relator, cujo parecer seria submetido à votação de seus membros.

Embora teria sido extremamente salutar debater o assunto profundamente em ambientes tão distintos como as comissões de agricultura, meio ambiente e seguridade social – aliás, a essência do processo legislativo é justamente essa –, optou-se por evitar a “morosidade” da tramitação regular e recorreu-se a um poderoso atalho previsto no Regimento Interno da Câmara: a criação de uma comissão especial, ou temporária, que substitui todas as demais.

No caso do PL dos agrotóxicos, a comissão especial criada para analisá-lo em caráter terminativo tem como presidente a deputada Tereza Cristina (DEM/MS), que não por acaso também é presidente da Frente Parlamentar Mista da Agropecuária, braço institucionalizado da bancada ruralista no Congresso. No parlamento brasileiro, as escolhas em geral não são gratuitas – e é sintomático que matéria de tamanha relevância social tenha sido entregue à representante máxima dos interesses do agronegócio no Congresso Nacional.

Aliás, o primeiro vice-presidente da comissão, Valdir Colatto (MDB/SC) também pertence à frente de apoio aos ruralistas. Assim como o segundo vice-presidente, deputado Raimundo Gomes de Matos (PSDB/CE). E também o relator do projeto, o paranaense Luiz Nishimori (PR).

Entre os cargos de direção da comissão especial, apenas o deputado Bohn Gass (PT/RS) não está ligado oficialmente à bancada ruralista. Ele está do outro lado da disputa, pois milita na Frente Parlamentar pelo Desenvolvimento da Agroecologia e Produção Orgânica. Ou seja, na condução da comissão destinada a analisar uma mudança dessa importância no setor, atribuiu-se para aqueles que defendem o fim do uso dos agrotóxicos nas plantações um cargo em cinco, não por acaso o mais baixo na hierarquia. Um verniz de pluralidade sempre foi apreciado na democracia brasileira.

Na composição total da comissão especial que decide o futuro do uso de agrotóxicos no Brasil, o placar também é bastante favorável aos ruralistas. Dos 27 membros titulares, nada menos que 20 filiam-se à frente parlamentar da agropecuária – o dobro daqueles que defendem os interesses da agricultura sem agrotóxicos. A comissão tem ainda 15 integrantes da Frente Parlamentar Ambientalista.

A tabela mostra a vinculação dos deputados titulares da Comissão Especial que analisou o projeto de lei sobre agrotóxicos às frentes parlamentares da agropecuária, ambientalista e de produção orgânica.
Fonte: Elaboração do autor a partir de informações da Câmara dos Deputados.

Mas é preciso ter cuidado com a tabela acima. O Congresso Nacional está repleto de parlamentares que se filiam a toda e qualquer frente parlamentar no afã de garantir votos e doações de campanha nas eleições futuras. No caso da comissão especial dos agrotóxicos, temos oito membros que se autoproclamam apoiadores, ao mesmo tempo, da agropecuária, da agricultura orgânica e do meio ambiente – e mais três que são ao mesmo tempo ruralistas e ambientalistas.

Embora, em tese, não seja impossível defender o agronegócio e o meio-ambiente simultaneamente, a rigor as pautas defendidas por cada um desses grupos é antagônica – em especial quando se trata do uso de pesticidas nas lavouras. Nesse caso, há evidências suficientes para desconfiar de que, entre esses parlamentares que acendem vela para deus e o diabo, o interesse dos ruralistas fale mais alto: afinal de contas, dos 11 parlamentares que estão vinculados a mais de uma frente, nada menos que 7 são, eles próprios, produtores rurais. E isso dá uma boa dica sobre de que lado eles estarão na hora de votar.

Mesmo se considerarmos como autênticos apenas os parlamentares que se filiam apenas a uma frente parlamentar, a comissão especial é dominada amplamente pelos ruralistas. Nela estão presentes 9 “ruralistas-raiz” contra apenas cinco adversários do uso de agrotóxicos – dois defensores da agricultura orgânica (Padre João e Bohn Gass) e três ambientalistas (Alessandro Molon, Jandira Feghali e Sarney Filho). É praticamente o dobro.

Para oferecer parecer ao projeto, a Comissão designou como relator o deputado Luiz Nishimori (PR). Na página oficial da Câmara o deputado se autodeclara “agricultor e comerciante” e, do ponto de vista da associação a frentes parlamentares, ele apoia tanto a causa dos ruralistas, quando dos ambientalistas e da produção orgânica. Mas não se engane com essa aparência de isenção. Ao longo das duas últimas legislaturas, o deputado paranaense relatou outras importantes proposições de interesse do agronegócio, como renegociações de dívidas, concessão de subvenções ao crédito rural e até (surpresa!) a isenção de tributos sobre a comercialização de fertilizantes e defensivos agrícolas.

Apesar de gerar tanta controvérsia na comunidade científica e na sociedade em geral, a Comissão Especial realizou poucas audiências públicas sobre o assunto. Em geral, houve uma atenção desmedida a agentes do setor e a dirigentes do Ministério da Agricultura, inclusive o agora ministro Blairo Maggi. Também foram convidados representantes de órgãos estrangeiros (EUA, Canadá e Austrália) que defenderam maior celeridade na liberação dos registros de princípios ativos.

A oposição bem que tentou fomentar o debate, mas a maioria dos requerimentos para a realização de audiências com representantes de visões divergentes não foi adiante. A situação chegou a tal ponto que, para dar voz a representantes do Ibama, Fiocruz, Idec e outras entidades contrárias à proposta, foi necessário recorrer à Comissão de Desenvolvimento Urbano, que não tinha nada a ver com a tramitação do projeto – uma vez que a Comissão Especial, dominada pelos ruralistas, interditou o debate.

Para encurtar a conversa, a Comissão Especial aprovou o parecer do deputado Luiz Nishimori na última segunda-feira, dia 25/06/2018. Ao final do processo, o projeto que na sua versão inicial tinha um único dispositivo tornou-se uma massa de 68 artigos, com repercussões sobre o setor, a segurança alimentar e o meio ambiente que carecem de uma urgente mobilização da comunidade científica e da sociedade em geral para avaliar as suas consequências.

O resultado da votação foi 18 a 9 pela aprovação do projeto. Entre os 18 parlamentares que votaram a favor, apenas um deputado não era vinculado à bancada ruralista. No lado contrário, 7 eram ambientalistas e mais um era defensor dos orgânicos – sendo apenas um signatário da Frente de Apoio à Agricultura.

O projeto que pretende regular a comercialização de agrotóxicos no Brasil pode até ser bom – eu não tenho conhecimento técnico para opinar a respeito. Mas a forma como ele foi conduzido, com evidente domínio da bancada ruralista, gera bastante desconfiança.

A matéria ainda vai a votação em Plenário, e pode até ser derrotada. Mas é urgente repensarmos o processo legislativo brasileiro para equilibrar o direito a voz na tramitação de projetos de lei, pois o quadro atual é altamente tóxico.

 

Post anterior: Mais algumas reflexões sobre a crise

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Sem dinheiro, sem tempo, sem voto: o dia das mulheres na política brasileira https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/03/08/sem-dinheiro-sem-tempo-sem-voto-o-dia-das-mulheres-na-politica-brasileira/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/03/08/sem-dinheiro-sem-tempo-sem-voto-o-dia-das-mulheres-na-politica-brasileira/#respond Thu, 08 Mar 2018 05:30:18 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=308 Baixa participação feminina no Congresso é reflexo da sociedade e também dos partidos brasileiros

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Vivem pros seus maridos, orgulho e raça de Atenas
(“Mulheres de Atenas” – Chico Buarque e Augusto Boal)

Para os especialistas, o nível de participação de mulheres em cargos eletivos é um indicador confiável do grau de amadurecimento das democracias: quanto mais postos o sexo feminino conquista, mais igualitário tende a ser o país – ou, pelo menos, mais preocupado em reduzir as diferenças entre homens e mulheres.

Não se trata apenas de uma questão de poder. Para fazer política, as mulheres precisam encontrar tempo e energia após cumpridas suas obrigações familiares e profissionais – e isso fica bem mais fácil quando há maior equilíbrio entre homens e mulheres no ambiente doméstico e no setor privado. Indo além, para serem eleitas as mulheres precisam de dinheiro e apoio partidário para que suas ideias sejam ouvidas e aceitas pelos eleitores.

Sob esse prisma, o Brasil tem uma posição vexaminosa no ranking de participação política das mulheres. Com pouco mais de 10% de mulheres na Câmara dos Deputados, a Inter-Parliamentary Union – uma associação dos parlamentos de todo o mundo – coloca o Brasil num ridículo 154º lugar entre 193 países, à frente apenas de alguns países árabes, do Oriente Médio e de ilhas polinésias.

No mapa abaixo, quanto mais escura a cor, maior a participação feminina nos Legislativos nacionais. Nele destacam-se como exemplos tanto sociedades claramente igualitárias – os países nórdicos (Islândia, Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca) à frente –, quanto países que implementaram cotas para mulheres nas cadeiras do Parlamento – e as surpresas aqui são países como Ruanda e Bolívia.

Mesmo aprovando uma lei que determina que os partidos e coligações reservem pelo menos 30% de suas vagas para candidatas do sexo feminino, a verdade é que as mulheres recebem um percentual muito baixo de votos nas eleições brasileiras. Tomando as eleições municipais – os pleitos que elegem os representantes mais próximos do nosso dia-a-dia –, podemos verificar que, se de um lado as candidaturas femininas venham até crescendo nos últimos anos – em resposta à legislação -, o percentual de votos recebidos pelas mulheres caiu nos últimos anos. E, como consequência, a parcela de vagas conquistadas por elas nas Câmaras Municipais permaneceu bastante baixa, abaixo de 15%. Isso significa que, no Brasil, há em geral 7 vereadores (homens) para cada vereadora (mulher).

O gráfico mostra a participação das mulheres nas eleições municipais brasileiras em relação a número de candidatos, votos e eleitos.
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral, dados compilados pelo autor.

O mais triste nesse resultado é que ele se encontra disseminado de forma bastante homogênea pelo país. Cruzando os dados de voto nas mulheres com indicadores como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o nível de escolaridade dos eleitores ou a renda da população, não se identifica qualquer relação entre essas variáveis. Isso quer dizer que não são os mais pobres, ou os menos escolarizados, ou os moradores dos rincões do país que votam menos nas mulheres – SOMOS TODOS NÓS. Ou seja, não levar as mulheres a sério nas eleições é algo absolutamente disseminado pelo território brasileiro.

E por que nós, brasileiros, votamos tão pouco em mulheres? Obviamente há uma forte questão cultural, ligada à discriminação, que pauta a luta diária das mulheres e que infelizmente só ganha visibilidade no dia 08 de março de cada ano.

Mas evidentemente não estamos nas últimas posições do ranking internacional de participação feminina na política apenas por isso. É claro que há um fator institucional que dificulta a chegada ao poder das mulheres. Essa barreira institucional tem origem nas relações de poder no âmbito dos partidos políticos brasileiros. E para demonstrar isso, apresento três exemplos gritantes.

Nas últimas eleições municipais de 2016, 18.244 candidatas não ganharam um voto sequer; isso representa 12,5% de todas as candidaturas femininas. Esse número contrasta fortemente com o resultado dos homens (apenas 2,6% dos candidatos masculinos não receberam nenhum voto) e é um forte indício de que partidos políticos estão inscrevendo mulheres, muitas vezes sem o seu consentimento, apenas para atender à exigência legal de ter 30% de suas vagas destinadas para o sexo feminino. O nome disso é fraude, e aparentemente o Tribunal Superior Eleitoral não tem dedicado muito esforço para punir essa prática.

Outra evidência de como as práticas dos partidos não amparam as mulheres está no financiamento eleitoral. Como pode ser visto no gráfico abaixo, com a grande exceção da Rede, em geral os partidos brasileiros destinaram, na média, menos recursos para suas candidatas do que para seus pares do sexo masculino em 2016. Da esquerda radical à direita, passando pelo Centrão, as cúpulas dos partidos reproduzem as práticas discriminatórias de nosso cotidiano.

O gráfico mostra a distribuição dos recursos partidários entre candidatos homens e mulheres nas eleições de 2016.
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral, dados compilados pelo autor.

Como dinheiro traz voto, o menor acesso das mulheres ao dinheiro distribuído pelos partidos resulta em menos votos e menos cargos eletivos conquistados – e isso explica boa parte da baixa representação feminina no Congresso.

Uma boa evidência de como as cúpulas partidárias contam para as chances de uma mulher conseguir se eleger no Brasil está no fato de que, das atuais 55 deputadas federais e 13 senadoras do Congresso, a metade (26 deputadas e 8 senadoras) é filha ou (ex) esposa de políticos mais experientes. Embora não possamos descartar os seus méritos pessoais, é razoável imaginar que o laço de parentesco com políticos influentes tenha facilitado o acesso dessas candidatas a recursos, doadores de campanha e uso da máquina partidária para serem eleitas. Afinal, só o senador Jader Barbalho conseguiu eleger sua ex e a atual esposa para a Câmara, as deputadas Eunice Barbalho e Simone Morgado. Para as mulheres que não contam com esses “cabos eleitorais”, eleger-se é uma missão quase impossível no Brasil.

Para não terminar essa trágica história sobre a participação feminina nas eleições brasileiras sem pelo menos um fio de esperança, destaco que muitos países têm aprovado reformas corajosas para estimular a competitividade das mulheres nas disputas eleitorais. Questões como cotas para mulheres na distribuição do fundo partidário, nos cargos diretivos dos partidos ou até mesmo nas cadeiras do Parlamento vêm sendo adotadas em diversos países para estimular, ainda que “de cima para baixo”, a participação feminina na política.

Discutir essas questões com seriedade é uma excelente pauta para este 08 de março.

 

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