O E$pírito das Leis https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br Thu, 13 Dec 2018 11:46:25 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Perdida a Copa, é hora de cair na real https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/07/07/perdida-a-copa-e-hora-de-cair-na-real/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2018/07/07/perdida-a-copa-e-hora-de-cair-na-real/#respond Sat, 07 Jul 2018 05:00:17 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=426 Olhando para trás nos 24 anos do Plano Real, os desafios para o futuro do Brasil ficam evidentes

2018 começa hoje. Já passou o Carnaval e perdemos a Copa do Mundo. Daqui a exatamente três meses teremos uma das eleições mais incertas da nossa história, sob os pesados efeitos de uma crise política sem precedentes e de uma das recessões mais violentas das muitas que já encaramos. É hora de acordar.

Nesta semana também comemoramos os 24 anos do Plano Real. É quase um quarto de século em que subimos um degrau na direção da decência econômica – fato notável comparado ao nosso passado de total descontrole inflacionário. E justamente num momento em que alguns candidatos começam a questionar a importância do regime de metas de inflação, vale a pena abrir o olho, porque este jogo não está ganho.

A inflação é um fenômeno econômico com múltiplas causas, mas é sobretudo um indicador de desequilíbrios – entre oferta e demanda, de custos, de políticas monetária ou fiscal. Ela também atinge de forma diferenciada ricos e pobres, pois os primeiros conseguem instrumentos financeiros para se proteger, enquanto os menos favorecidos penam com a carestia.

Levando em consideração os 24 anos do Plano Real, é possível perceber também que a inflação se manifestou de maneira bastante diferenciada entre os setores da economia brasileira. No gráfico abaixo eu apresento a inflação acumulada entre julho/1994 e maio/2018, de acordo com a classificação por itens do IBGE.

A análise desagregada da inflação brasileira por itens oferece um excelente panorama dos desequilíbrios presentes em nossa economia. Olhando para trás, é possível vislumbrar os imensos desafios que o novo ocupante do Palácio do Planalto terá de lidar a partir de janeiro de 2019.

Observando o gráfico acima, podemos constatar que o único grupo que apresenta queda real de preços entre 1994 e 2018 é “TV, som e informática”, possivelmente em decorrência da intensa evolução tecnológica observada no período. Além disso, produtos de setores tradicionais (alimentos, bebidas, calçados, vestuário, etc.) e outros que enfrentam concorrência internacional (eletrodomésticos, foto e filmagem, veículos, etc.) apresentaram, em geral, aumentos de preços abaixo da média geral do IPCA no período. Por outro lado, serviços fornecidos ou regulados pelo Estado (saúde e educação privadas, combustíveis, telecomunicações e energia elétrica) dominam a lista com os maiores aumentos.

Esse resultado já oferece três importantes prescrições de política econômica a serem consideradas seriamente pelos candidatos. A primeira delas é que inovação faz muito bem para a economia, pois permite aos empresários ofertar produtos melhores a preços menores – e isso é tudo o que o consumidor deseja. Em seguida, a concorrência internacional enfrentada pelos setores tradicionais mostra-se benéfica para o conjunto da sociedade, uma vez que força reduções de preços dos produtos que sofrem com a competição de importados.

A terceira conclusão sobre os dados apresentados acima é que parece haver algo bastante grave na forma como o Estado brasileiro regula os serviços públicos. O fato de os preços desses serviços correrem bem acima da inflação geral da economia revela que temos falhas de governo graves, que passam por regulação deficiente, falta de concorrência e captura de agências e agentes reguladores pelo setor privado.

Para evidenciar melhor esses problemas, criei o gráfico abaixo com a evolução mensal dos preços desses 51 bens e serviços ao longo dos últimos 24 anos. Para tornar a análise visualmente mais agradável, apresentei os dados numa média móvel de 12 meses, de forma a suavizar as flutuações nos preços decorrentes a choques internos e externos (secas, inundações, quebras de safra, variações abruptas no câmbio, etc.).

Para quem tiver paciência, recomendo selecionar um ou mais setores individualmente no filtro, bem como compará-los com o índice geral do IPCA.

Observando a evolução individualizada dos setores, é possível perceber outros movimentos importantes da economia brasileira nos últimos anos.

Tome, por exemplo, os preços dos combustíveis, que estiveram no olho do furacão com a greve dos caminhoneiros. Comparando a sua evolução com o IPCA geral, é possível verificar que os preços se descolam no início dos anos 2000, quando o governo FHC gradualmente abandona a política da conta-petróleo e paralelamente observa-se o boom das commodities e do preço do petróleo.

A partir do segundo mandato de Lula (2007-2010) e durante o governo Dilma essa tendência de alta é contida, tanto em função da conjuntura externa (crise de 2008) quanto de uma política deliberada dos governos petistas de intervir na política de preços da Petrobrás para segurar a inflação. Com a ascensão de Temer (2016) os preços são novamente liberados, levando-se a um aumento contínuo e intenso, motor da crise recente.

Ainda no campo dos combustíveis domésticos, a história é ainda mais grave: embora a dinâmica tenha sido a mesma, os aumentos no preço do gás de cozinha foram sensivelmente mais intensos, inclusive nos governos petistas. Não por acaso esse é o setor campeão em aumento de preços na era do Real – e justamente um setor com forte impacto no orçamento da população mais pobre.

Por falar em impactos distributivos, experimente selecionar os preços de Veículos Próprios e de Transporte Público no gráfico acima: você vai perceber nitidamente como a política de incentivos do governo, de FHC a Temer, foi capaz de conter os preços dos automóveis abaixo da inflação geral, enquanto as passagens de transporte coletivo, em média, octuplicaram (sim, aumentaram mais de 8 vezes!) desde 1994.

[Na minha cidade, BH, a situação é ainda pior: quando cheguei por aqui em outubro de 1994 o ônibus urbano custava R$ 0,35. Agora está em R$ 4,05.]

Esse resultado demonstra que há algo de profundamente distorcido num governo que privilegia, com bilhões de incentivos fiscais, o transporte individual em detrimento de uma imensa massa de pessoas que depende diariamente de um serviço caro e ineficiente. E a contar com a medida provisória editada ontem pelo presidente Temer, essa rota será seguida até pelo menos 2030.

Outro problema grave no Brasil é a falta de concorrência enfrentada por alguns setores – e em muitos casos é o próprio governo que patrocina a concentração do mercado. Tome o caso do setor de carnes. No gráfico acima é possível ver como os preços desse setor se descolam do IPCA geral a partir justamente da “era Mantega” e da política de campeões nacionais do BNDES. Os incentivos dados à JBS e a outros grandes grupos frigoríficos matou a concorrência de muitos pequenos e médios frigoríficos, e quem pagou esse preço salgado foi, claro, o consumidor.

Guimarães Rosa disse no Grande Sertão que viver é perigoso. Podemos acrescentar que é também cada vez mais caro. Serviços essenciais básicos – como habitação (ver “aluguel e taxas”), educação e saúde(“serviços médicos e dentários”) – têm se tornado cada vez mais caros ao longo das últimas décadas, como atesta a ampliação contínua da distância entre as suas respectivas curvas de preços com a média do IPCA.

Faltava falar da energia elétrica. Além de ser um setor que sofreu um fortíssimo aumento de preços depois do apagão do governo FHC, houve a desastrosa intervenção governamental promovida por Dilma Rousseff no final do seu primeiro mandato. O gráfico mostra como a ação de Dilma provocou um alívio passageiro para os consumidores (a linha mostra um “dente” no período), mas que se revelou um verdadeiro presente de grego: os preços disparam a partir de 2015, mantendo-se desde então num patamar muito acima do verificado antes da canetada da petista.

Falhas de regulação, falta de concorrência, incentivos distorcidos, graves conflitos distributivos e excessiva intervenção estatal: os desafios para o próximo governo vão muito além de aumentar ou não a meta de inflação. A Copa acabou, as eleições estão aí, e é hora de cobrar dos candidatos as propostas para enfrentá-los.
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Folha estreia blog sobre leis em discussão no Congresso https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2017/06/13/folha-estreia-blog-sobre-leis-em-discussao-no-congresso/ https://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/2017/06/13/folha-estreia-blog-sobre-leis-em-discussao-no-congresso/#respond Tue, 13 Jun 2017 05:00:53 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://oespiritodasleis.blogfolha.uol.com.br/?p=23 Nesta terça-feira (13), a Folha estreia o blog O E$pírito das Leis, assinado por Bruno Carazza dos Santos, 39, doutor em Direito (UFMG), mestre em Economia (UnB) e bacharel em Direito e em Ciências Econômicas (ambos os cursos pela UFMG).

Carazza é servidor público federal, da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental.

Por 8 anos, manteve o blog Leis e Números (www.leisenumeros.com.br), com reflexões sobre temas comuns às áreas do Direito, da Economia e da Ciência Política numa linguagem acessível e baseada em dados.

Os textos do novo espaço vão analisar, numa abordagem multidisciplinar, os objetivos, os interesses em jogo e os possíveis efeitos de propostas legislativas em discussão no Congresso Nacional.

“Em suma, pretendo tentar desvendar, com mais profundidade e sem partidarismos, “O E$pírito das Leis”, diz o blogueiro.

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